terça-feira, 20 de janeiro de 2015

O COZINHEIRO, O POETA, O ESTUDANTE E O REI



Há muitos e muitos anos um rei prendeu um cozinheiro no porão do castelo para cuidar de suas aves. No mesmo dia, um poeta também foi trazido à presença do rei para ouvir sua sentença: “A partir de hoje, você não mais escreverá versos. No lugar da pena, você segurará a colher de pau e mexerá os alimentos dentro das panelas. E, quando não estiver cozinhando, estará lavando e cortando os legumes, ou, ainda, limpando a cozinha. Sempre haverá o que fazer, e eu o proíbo de entregar-se ao devaneio.”

Uma semana depois, um jovem estudante foi preso e ficou alarmado quando ouviu o rei dizer: “A partir de hoje, você ajudará na limpeza e na conservação do castelo.” O estudante ousou exclamar: “Eu não posso abandonar os estudos!... Eu quero me formar e ter uma profissão!...” O rei, olhando-o com frieza, afirmou: “Os seus instrumentos de trabalho serão a vassoura e o escovão. Esqueça os livros e comece a trabalhar agora. A propósito, eu o proíbo de entrar na biblioteca. Ela será o único lugar que você não deverá limpar.” O estudante ainda aventurou-se a dizer: “Vossa Majestade não compreende!... Eu sempre me dediquei aos estudos e sou muito vagaroso quando se trata de realizar trabalhos pesados.” O rei disse apenas: “Problema seu!”

Uma semana após a chegada do estudante, enquanto ele varria a sala de jantar, ele se surpreendeu ao ver o seu amigo poeta entrando na sala, com uma tigela nas mãos. Após os dois se cumprimentarem, o estudante perguntou: “O que você faz aqui?!... Não me diga que aprendeu a cozinhar?!...” O poeta exclamou tristemente: “Eu jamais aprenderei a cozinhar!... Eu passo horas tentando preparar receitas que outros cozinheiros fazem em minutos!... É um desperdício de tempo e energia, e o resultado é sempre um desastre!... Eu não sei o que fazer!... Eu queria melhorar, mas não consigo e acabo sempre sendo alvo de riso. Isso parece um castigo!... A inspiração me visita, e eu não posso escrever!... O pior de tudo é que o rei parece sentir um prazer mórbido toda a vez que ele visita a cozinha e me surpreende em uma situação embaraçosa. Ele não se aborrece. Muito pelo contrário, ele parece se divertir com o meu constrangimento.”

Minutos depois, era o poeta quem escutava o  estudante dizer: “Comigo acontece a mesma coisa!... Eu fico preocupado e ansioso porque estou sempre atrasado com a limpeza, e o rei se compraz com o meu sofrimento. Além disso, eu sinto falta dos livros. Eu daria tudo para ter acesso à biblioteca do castelo, e é exatamente lá o único lugar que eu não posso limpar!... Eu tenho a impressão de estar sendo punido!... É evidente que você também está aqui contra a sua vontade!...”

O poeta respondeu: “Sim, e o cozinheiro da taverna também. Você se lembra?!... Embora ele adorasse comer aves, ele tinha alergia a penas. Naquele dia em que você estava treinando com o seu arco e abateu aquele falcão, ele o cozinhou, mas fui eu quem tive que arrancar as penas!...”

O poeta ficou surpreso quando ouviu o estudante exclamar: “Está explicado: aí está o motivo!... Enquanto o cozinheiro estava temperando o falcão, ele disse que poderíamos nos sentir honrados porque teríamos a oportunidade de saborear um dos falcões reais. Estamos sendo punidos pela morte do falcão!... Jamais conseguiremos escapar!... Eu ouvi dizer que o ódio do rei é implacável!... Ele ama a vingança e nunca perdoa!”

O poeta, procurando se desvencilhar do nervosismo, aconselhou: “Acalme-se!... Se nos desesperarmos, não encontraremos a solução. Tanto quanto você e o cozinheiro, eu quero a minha vida de volta. Precisamos de aliados. Se agradarmos aos que estão ao nosso redor, talvez, eles nos ajudem a fugir. Eu o aconselho a ser gentil e prestar os favores que estiverem ao seu alcance.”

O poeta, discretamente, tornou-se o “cupido” do castelo. Até mesmo o chefe da guarda pediu-lhe que recitasse, em seu nome, versos embebidos de paixão para a mulher que ele amava. O estudante, por sua vez, não perdia a oportunidade de esclarecer as dúvidas das crianças e dos jovens. Ele até mesmo passou a realizar seus deveres de casa. E todos sabiam por que tanto o poeta quanto o estudante não mediam esforços em ajudá-los: eles desejavam viver a vida em vez de sucumbirem ao peso da vingança do rei.

Felizmente o plano deu certo: eles conquistaram amigos que libertaram o cozinheiro e os ajudaram a fugir. Quando o rei descobriu que os seus planos de vingança haviam sido interrompidos, ordenou que os fugitivos fossem recapturados. Mas, contrariando discretamente as ordens reais, ninguém se empenhou na busca, e o cozinheiro, o poeta e o estudante viveram felizes para sempre.


2 comentários:

  1. Sisi, adoro as suas historias!!! Essa esta incrivel!!!
    Bjs e um dia de paz!!!
    Obrigada pelo carinho la no blog!!!

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    1. Obrigada, Lucia, por suas palavras de incentivo!!!...
      Eu também admiro muito o seu trabalho e a sua dedicação aos Blogs!!!...
      Beijos

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